domingo, 25 de maio de 2008

ENTREVISTA » VICENTE VAZ: Pacientes abusam de remédios

Publicado em 25.05.2008 Jornal do Commercio


Toda vez que a dengue volta a crescer no País, reaparecem boatos sobre fórmulas milagrosas para tratamento e prevenção da doença, além de alertas diferentes sobre medicamentos. Diante da confusão de informações e do crescente número de doentes em Pernambuco, com dez mortes já confirmadas este ano, o JC ouviu o infectologista Vicente Vaz, do Hospital Oswaldo Cruz, e professor da Universidade de Pernambuco, para esclarecer dúvidas. Aos 46 anos, tratou pessoas com dengue nas duas últimas décadas no Recife e acumulou ampla experiência no assunto. A seguir, o especialista fala a Veronica Almeida sobre os cuidados que a pessoa com dengue deve ter. Alerta para o abuso no uso de remédios e destaca a importância da hidratação.

JC – O professor de infectologia Edimilson Migowski, do Rio de Janeiro, pede cautela no uso de paracetamol. Diz que a droga prejudica o fígado, que já é atacado pelo vírus da dengue. O senhor concorda com isso?
VICENTE VAZ – O paracetamol é uma droga potencialmente tóxica ao fígado e pode trazer algum dano hepático a um pequeno número de pessoas, porém necessita ser utilizado em altas doses para que isso ocorra. Pouquíssimos podem ter a função hepática alterada com o paracetamol usado em doses terapêuticas. É uma droga segura e deve ser utilizada sem maiores problemas nos pacientes com dengue. Entretanto, grande parte dos pacientes acredita que o paracetamol não somente faz parte do tratamento da dengue como é obrigatório tomá-lo para ficar bom. Muitos tomam paracetamol de forma abusiva e, sobretudo, desnecessária. Um exemplo prático é quem apresenta febre de 38 graus, sente-se bem e usa antitérmico porque está com febre. A febre não necessita ser tratada sempre, assim como as dores no corpo, se são leves. O que importa é manter a hidratação adequada. Os pacientes podem até deixar de comer, mas não podem deixar de tomar líquidos.


JC – Qual a dose ideal de antitérmico e analgésico?

VICENTE – Os analgésicos e antitérmicos seguros na dengue são paracetamol e dipirona. A dose, para adultos, é de 750 mg e 500 mg, até de seis em seis horas. Portanto, pode-se tomar o remédio em intervalo maior que seis horas. Pacientes com febre alta e antecedentes de convulsões febris devem ser medicados mais agressivamente para evitar que a temperatura chegue a níveis elevados. Idosos geralmente têm pouca resposta febril e necessitarão de menos drogas para o controle da febre. Eu prefiro a dipirona como analgésico e antitérmico por ser mais potente e muito segura, exceto em pacientes que tiveram reação adversa à mesma. Raros necessitarão simultaneamente de paracetamol e dipirona, alternados.


JC – Que remédios podem ser usados para tratar o mal-estar da dengue?

VICENTE – Para o prurido anti-histamínicos podem fornecer algum alívio, assim como soluções à base de calamina. Para as dores, que podem ser intensas, pode ser utilizada uma droga que é uma associação de codeína e paracetamol, porém é uma droga de uso controlado. Para os enjôos e vômitos eu recomendo o Dramin B6 (nome comercial) apesar da sonolência que alguns pacientes têm com o mesmo, o que pode ser útil para outros que não conseguem dormir bem pelos desconfortos da doença.


JC – Quem usa remédio controlado deve mantê-los?

VICENTE – O paciente deve, sempre, informar ao médico sobre medicações em uso, sobretudo as de uso contínuo. Com relação a antidepressivos não há maiores problemas e eles podem ser continuados. Quem toma anti-hipertensivos deve ter cautela e monitorar, mesmo em casa, a pressão arterial, diminuindo ou mesmo suspendendo as drogas caso haja queda da pressão durante a doença. Deve informar ao seu médico e a quem cuida da dengue sobre o que está acontecendo. Diabéticos que tomam comprimidos ou insulina devem prestar atenção a níveis de glicose no sangue, pois pode haver hipoglicemia, por estarem ingerindo poucas calorias. Talvez sejam necessários ajustes ou suspensão das drogas, havendo a necessidade de combinar com o endocrinologista a forma segura de fazer isso.


JC – Quem mais deve ficar atento?

VICENTE – Quem usa anticoagulantes como warfarin (Coumadin, Marevan são os nomes comerciais), por embolia pulmonar, trombose profunda ou outra razão, deve ter atenção se houver suspeita de dengue, pois a doença pode diminuir o número de plaquetas de forma drástica e aumentar o risco de sangramentos. A melhor estratégia será definida entre quem está tratando o paciente e o médico assistente que prescreveu o anticoagulante, podendo ser necessária a suspensão temporária das drogas. Os pacientes que usam AAS ou Clopidogrel merecem atenção redobrada, pois têm a função das plaquetas alteradas e, com uma maior redução delas, pode haver risco de sangramentos graves.


JC – Como fazer hidratação?

VICENTE – Ela é ponto crucial no tratamento da dengue. Água é a primeira opção e deve ser ingerida em pequenas quantidades muito freqüentemente, de preferência gelada, sobretudo se houver o paciente apresentar náuseas. As alternativas são muitas e incluem água de coco, uma excelente opção por conter elementos fundamentais para uma ótima reidratação, sucos, refrescos, chás e isotônicos. Devem ser evitados refrigerantes. Os líquidos quentes tendem a produzir mais náuseas, mas não estão contra-indicados.

JC – E a alimentação?

VICENTE – Deve ser a que o paciente tolere bem. Nos primeiros dias de doença, em geral não há apetite e não precisa forçar a ingestão de alimentos. Tem que haver boa hidratação e em poucos dias o apetite retorna.


JC – Quais os sinais de gravidade ?

VICENTE – O paciente deve estar seguro que o diagnóstico é mesmo dengue. Outras doenças potencialmente graves podem ter sintomas idênticos. Um sinal de gravidade é a presença de vômitos constantes. Quem vomita não consegue se hidratar, precisa ser medicado e hidratado no hospital, assim pode retomar o tratamento em casa. Outro sinal são sangramentos, que podem sugerir dengue hemorrágica (também pode haver sangramento na dengue clássica). Tonturas e desmaios devem ser valorizados, podem indicar necessidade de internamento. Dor abdominal é sempre um indicador de gravidade, sobretudo se contínua. Outros sinais menos comuns são desorientação, olhos amarelados e diminuição do nível de consciência.


JC – Adianta tomar vitaminas C e B12?

VICENTE – Não há tratamento específico para a dengue. Vitaminas não funcionam e o que podemos fazer é monitorar a situação do doente, mantê-lo hidratado, tratar os sintomas e ficarmos alertas para os sinais de gravidade. É importante lembrar que a dengue é uma doença benigna na imensa maioria dos casos, o que não quer dizer que não seja um aborrecimento na vida de quem a contrai. Dengue hemorrágica é a exceção e ocorrerá em poucos pacientes.

Um comentário:

Unknown disse...

Olá! Pode tomar dramin b6 com paracetamol? Pq tomei e to passando mal..